O cativar e o cativeiro

Um dos temas mais desdobrados em meu consultório está ligado aos afetos. Pessoas querendo cativar, outras querendo ser cativadas e outras ainda não sabendo o que fazer com as relações já cativadas. Uma das frases mais conhecidas encontradas em quadros, tatuagens, camisetas é a do Pequeno Príncipe: “Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas”.

Gostaria de dividir reflexões sobre estas palavras tão fortes: Eternamente, Responsabilidade e Cativar, claro que individualizando deste texto as pessoas legalmente incapazes.

Acredito que Eternamente é muito tempo. Para que isso aconteça, as coisas deveriam ser estáticas e isso não me parece possível. Até porque para falar de tempo é necessário dividir mundo interno e externo. Embora pareça que o tempo na tristeza passa mais devagar, isso acontece porque o sofrimento demanda preocupação; a preocupação demanda esforço que, por sua vez, requer atenção. E, na atenção, nos detemos a observar o tempo. Na alegria, não há preocupação, esforço ou atenção. Daí, sentimos que o tempo passa mais rápido. E, quando percebemos, temos a grata surpresa que as situações estão organizadas de forma atemporal.

Responsabilidade carrega a complexidade na necessidade do amadurecimento do sujeito, algo nada fácil de acontecer podendo disparar uma persecutoriedade, pois é mais fácil não acreditar em ninguém do que se deixar na mão de um outro. Seria bom que nas relações as pessoas se comprometessem exatamente 50% cada um. Talvez utópico, porque essa dupla teria que se alinhar no amadurecimento das fases do Amor (tema de meu próximo texto).

Cativar fica mais em um campo inconsciente, pois é difícil saber
exatamente o motivo daquela pessoa ter me cativado. Seria uma falta minha
que eu fantasio ter encontrado no outro? Essa falta seria minha “metade” tão
procurada? Mas falar de metade é muito, assim como colocar-se como
completo também.


Seria o Cativar o início de todo amor?

E esta palavra tão doce que tem um toque de esperança se enlaça com
uma palavra tão cruel como Cativeiro. Como se deixar cativar sem se encontrar
em cativeiro?

Cativeiros emocionais são vistos em muitas relações e pouco se
percebe ou se nomeia tal situação. Talvez pareça que aqui tento falar apenas
de relações amorosas como um marido que se sente em cativeiro, pois sua
esposa infeliz que, aos olhos mais simplistas pode parecer ser ela a cativa,
mas na verdade, é ele quem se sente ameaçado ou em cativeiro pela culpa de
destruir um lar que já não está mais em seu desejo.

Porém, gostaria que você, leitor, ampliasse as associações para toda e
qualquer relação: seja ela de um funcionário com o seu líder até uma mãe com
seu filho que, por exemplo, mesmo adulto não conseguiu sair de casa, pois
encontra-se repleto de culpas de deixar a sua mãe em solidão.

As fantasias de um cativeiro podem ficar as voltas do gozo de ser
‘procurado’, o que me vincula a um ser importante, mas o desespero de não
ser encontrado pode com o tempo desesperançar um coração.

Para alguém preso em um cativeiro real, é natural acionar a Lei. Mas, no
campo afetivo, cabem alguns questionamentos a serem desvendados: como
fica a mistura entre o Amor e a Justiça? Há também aquele que a chave do
cativeiro está pendurada ao lado da porta. Por que ele não a abre? Para
outros, o tempo forcluiu (acabou) para sair do cativeiro. Há saída para esse
caso?

É possível dizer que o medo da solidão e o sentimento de incapacidade
de enfrentar o mundo lá fora são os motivos mais encontrados no meu divã.
Então, pontuo aqui que a construção de um sujeito independente é a saída
mais difícil, mas talvez, a única para ninguém precisar deslocar no outro o
papel de vilão e responsabilizá-lo por sua prisão.

A construção de um sujeito que se desenvolveu em Amor consegue unir
as palavras Amor e Justiça e com isso a hierarquia encontrada não será a
chave de um cativeiro.

Para continuar com as reflexões, dr. Seuss (roteirista e cartunista infantil
norte americano) afirmou: “Somos todos um pouco estranhos e a vida é um
pouco estranha e, quando encontramos alguém cuja estranheza é compatível
com a nossa, nos juntamos com esse”.

Psicanalista Renata de Masi
Psicóloga, Especialista em Educação e Psicanálise, Coordenadora do Espaço Rêverie, Coordenadora e Professora do ILPC-ABC e Supervisora Clínica. Idealizadora e Responsável Técnica do Projeto Refletir. 

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